O nosso sócio Guilherme Chambarelli publicou o artigo "Revogação ou não do Perse e o futuro do setor de eventos" no portal JOTA. Confira na íntegra:
A revogação do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), no final do ano passado, ainda tem suscitado grande preocupação nos segmentos ora contemplados pelo benefício fiscal, como os setores de eventos, turismo e cultura.
Para entender o tema, é importante lembrar que, no apagar das luzes de 2023, o governo federal editou a MP 1202/2023, que antecipou o término do benefício da alíquota zero de IRPJ, CSLL, PIS e Cofins estabelecido no âmbito do Perse. Anteriormente programado para encerrar em fevereiro de 2027, o programa agora tem previsão de término a partir de 1º de janeiro de 2025 para o IRPJ e a partir de 1º de abril de 2024 para CSLL, PIS e Cofins. Pelo menos por enquanto.
Essa medida surpreendeu os setores de eventos, turismo e cultura, dentre outros, desencadeando debates acalorados sobre sua constitucionalidade e legalidade, especialmente devido à potencial violação da segurança jurídica. Desde então, a incerteza gerada pela revogação do Perse tem alimentado preocupações entre os empresários desses setores, que agora aguardam esclarecimentos e medidas compensatórias por parte das autoridades competentes.
Naquela época, o governo federal optou por revogar o Perse em meio a preocupações com possíveis fraudes envolvendo a obtenção do benefício. Embora a intenção inicial do programa fosse proporcionar alívio financeiro para os setores mais afetados pela pandemia, relatos de abusos e irregularidades levaram à decisão de encerrar o programa.
Mesmo diante desse cenário, havia a expectativa de que o governo pudesse reconsiderar a revogação do Perse ou, no mínimo, oferecer uma alternativa para apoiar os setores afetados. No entanto, ao alterar a MP 1202, a recente MP 1208/2024 abordou apenas a desoneração da folha de pagamento, sem fazer menção ao Perse. Essa omissão reforça a manutenção da revogação, por ora, deixando o setor de eventos em uma situação ainda mais delicada. A falta de uma medida compensatória ou uma transição adequada aumenta a incerteza e a vulnerabilidade desses setores, que continuam aguardando uma solução que proporcione estabilidade e apoio necessário para sua recuperação.
Ante essa lacuna, o ministro Fernando Haddad afirmou sua intenção de apresentar um projeto de lei que propõe a criação de um novo programa com foco em segmentos que ainda não se recuperaram no pós-pandemia.
Nesse sentido, é fundamental que o governo tenha sabedoria em separar os problemas relacionados às fraudes do apoio oferecido pelo Perse aos setores afetados. Penalizar todo um setor, incluindo pequenas empresas, por questões de fraudes que elas não têm relação direta é injusto. Em vez disso, as fraudes devem ser combatidas como tal, por meio de fiscalização rigorosa e penalidades, em vez de acabar com um programa que visa proporcionar alívio e suporte a esses setores.
Além disso, é importante ressaltar que o cenário ideal seria que o governo reconsiderasse a revogação do Perse, tendo em vista sua ilegalidade e inconstitucionalidade. A medida adotada vai de encontro ao disposto no artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN), que preconiza a segurança jurídica e a proteção da confiança legítima dos contribuintes ao prever a impossibilidade de revogação ou modificação de isenção com prazo certo, conceito no qual, no nosso entendimento, aplica-se também para alíquota zero.
Com efeito, ainda que, conforme as declarações do ministro Haddad, o Perse venha a ser “mais focado” em determinados setores, essa modificação não deve prejudicar aqueles que anteriormente eram contemplados e usufruíam dos benefícios. O projeto de lei não deve excluir do âmbito de aplicação do Perse aqueles que já estavam devidamente enquadrados. Resta apenas a necessidade de punir quem de fato praticou fraudes, sem penalizar injustamente os setores que estão em conformidade com a legislação até então vigente.
E mesmo que a revogação do Perse seja mantida, é imprescindível que sejam estabelecidas medidas de transição mais saudáveis e justas, que pelo menos amenizem os prejuízos do setor. Uma alternativa viável seria permitir que as empresas retornassem ao Simples Nacional durante o exercício de 2024, até o final de junho, por exemplo. Isso permitiria que empresas que optaram por outro regime tributário, sem saber se a MP seria ou não convertida em lei, mas confiando em uma possível não conversão, possam adequar suas escolhas.
Outra possível alternativa seria estabelecer um teto para o Perse, onde o benefício seria aplicável apenas até um determinado limite de faturamento, sendo que o excedente seria tributado de acordo com regras específicas. Essa medida possibilitaria que as pequenas empresas dos setores de eventos, turismo e cultura continuassem a usufruir do programa, desde que respeitassem o limite estabelecido.
Na realidade, essas alternativas poderiam ajudar a amenizar os efeitos prejudiciais da revogação do Perse, mas não seriam a solução ideal. O melhor seria que o governo reconhecesse que a medida não está em conformidade com os critérios constitucionais e legais, ou que o texto não fosse convertido em lei, assegurando, assim, a segurança jurídica e a proteção da confiança dos contribuintes.
É importante ressaltar que o setor de eventos desempenha um papel fundamental na economia, gerando empregos e movimentando diversos outros setores. Portanto, é basilar que o governo adote medidas efetivas para garantir a sobrevivência dessas empresas e do setor como um todo.