O portal JOTA publicou hoje, dia 16.02.2021, o artigo “Marketing digital, growth hacking e créditos com insumos de PIS e COFINS“, escrito pelo sócio Guilherme Chambarelli em coautoria com Gabriel de Sá Balbi Cervino.
A propaganda é a alma do negócio. A frase é bastante antiga e ilustra bastante o sentimento do mercado acerca da importância do bom trabalho de marketing para o crescimento de uma empresa. Apesar de ainda aplicável aos dias de hoje, não revela a realidade da atual dinâmica do mercado.
Em linhas gerais, de acordo com Philip Kotler, “marketing é a ciência e arte de explorar, criar e proporcionar valor para satisfazer necessidades de um público- alvo com rentabilidade”.
Antigamente, o marketing era muito restrito aos canais de mídia offline, como outdoors, anúncios em jornais, revistas, televisão e rádio. No entanto, com o crescimento da internet, esse lado mais tradicional foi perdendo espaço para o marketing digital, que consiste no “conjunto de atividades que uma empresa executa online com o objetivo de atrair novos negócios, criar relacionamentos e desenvolver uma identidade de marca”.
Ao lado disso, estamos vivendo a era dos dados e das startups enxutas, que pivotam suas estratégias a cada movimento novo detectado e testam suas hipóteses constantemente.
Com o esclarecimento conceitual do marketing digital, resta proceder às controvérsias tributárias que envolve essa atividade, no Judiciário brasileiro.
Em fevereiro de 2018, o Recurso Especial n° 1.221.170/PR, decidido em recurso repetitivo pelo STJ, promoveu uma definição de insumo em caráter extensivo, tratando-o como todo bem ou serviço que possa ser considerado essencial, ou relevante, para a atividade econômica desempenhada pelo contribuinte. Nos anos que se seguiram, o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) adotou e aplicou tal definição em alguns de seus julgados. Entretanto, já houve instâncias em que o órgão excluiu da aquisição de créditos as despesas com serviços de marketing, por não considerar a realização de tais atividades como correlatas com o recebimento de receita por parte da empresa. No mesmo evento, o órgão também argumentou que os insumos capazes de conferir o direito de se apropriar créditos devem seguir os critérios do Art. 3º, inciso II, das Leis n° 10.637/2002 e 10.833/2003, que define como geradores de crédito somente a prestação de serviços e a produção de bens e produtos destinados à venda.
Porém, se a propaganda realmente é a alma do negócio, conforme, a frase que inicia este artigo, estaríamos diante de uma despesa essencial para a atividade da empresa, com a devida licença poética por conta da diferença entre marketing e propaganda.
Fato é que toda empresa depende do marketing para seguir vivendo em meio a uma concorrência cada vez maior. Para além disso, o advento do marketing digital permite muito mais do que divulgar a marca ou o produto. É possível medir comportamentos, acompanhar métricas de consumo, entender a necessidade do consumidor e, com isso, testar hipóteses e traçar novas estratégias comerciais. O marketing digital deixou de ser apenas a divulgação.
Existem técnicas como o growth hacking, muito utilizado pelas startups, que consiste na busca pelo crescimento por forma não tradicionais. João Vitor, Head de Growth do Gestão 4.0, nos conta que as estratégias de GH são baseadas na experimentação, a constante busca por melhorias dos seus resultados nos mais diferentes indicadores.
Apesar do avanço do mercado nesse sentido, o Carf ainda não examinou a matéria com a devida profundidade. Em determinados casos, se aplica o critério da essencialidade para as atividades de marketing, como é o caso do Acórdão n° 3201-005.668, decidido em 21 de agosto de 2019. Nele, o órgão determina que atividades de marketing são insumos somente se o marketing for a finalidade principal da empresa, e não apenas um meio para aumentar as vendas de produtos e serviços. Ocorreu também a diferenciação entre empresas varejistas, que utilizam publicidade para obterem sua receita do consumidor final, e aquelas cujos clientes são entidades que controlam o estabelecimento comercial utilizado no marketing, denominadas de “credenciadoras”.
A atividade de marketing é compreendida como especial e distinta da comercialização, devendo ser comprovada documentalmente pela empresa para a obtenção do crédito. Nela, o produto entregue ao cliente é a capacidade de vender, e não a venda.
No entanto, observa-se que esses acórdãos não foram tão profundos em abordar as particularidades do marketing digital, growth hacking e a nova dinâmica do mercado de startups, assuntos jurídicos bastante recentes e com muitas controvérsias a serem tratadas pela Lei e jurisprudência.
Em breve, é possível que essa discussão atinja um novo patamar de complexidade, pois tramita no Supremo Tribunal Federal (STF) o julgamento, em Repercussão Geral, do Recurso Extraordinário n° 841.979, que poderá restringir a não-cumulatividade à previsão legal explícita, caso determine que é constitucional o Art. 195 §12 da Constituição Federal. Tal solução geraria conflitos com o RE n° 1.221.170/PR, restando ao tributarista acompanhar o caso e inteirar-se da jurisprudência administrativa e judicial.