Novo artigo! Confira a análise de Guilherme Chambarelli sobre a Jurisprudência do STF e os impactos da revogação da alíquota zero no âmbito do Perse, publicado na Revista ConJur. Leitura obrigatória para entender as implicações tributárias no setor de eventos.
O Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (Perse), criado pela Lei nº 14.148/2022, surgiu como uma resposta do governo para impulsionar a recuperação de um dos setores mais afetados pela pandemia do Covid-19.
Em um de seus dispositivos mais importantes, especificamente no artigo 4º da Lei nº 14.148, reduziu para zero as alíquotas do IRPJ, CSLL, PIS e Cofins para empresas atuantes no setor de eventos. O benefício fiscal estava previsto para vigorar por um período de 60 meses, com validade até fevereiro de 2027.
No entanto, o governo federal, por meio da Medida Provisória n° 1.202/2023, propôs a revogação do benefício fiscal de forma antecipada. A MP alterou o artigo 4º da Lei nº 14.148, prevendo o fim dos benefícios do Perse a partir de 1º de janeiro de 2025 para o IRPJ e a partir de 1º de abril de 2024 para CSLL, PIS e COFINS.
Equivalência entre alíquota zero e isenção
Aqui surge um ponto de discussão: a equiparação da alíquota zero à isenção para efeitos de aplicação do artigo 178 do Código Tributário Nacional (CTN). Com efeito, o Supremo Tribunal Federal já consolidou entendimento de que a alíquota zero e a isenção são institutos equivalentes, inclusive para fins da aplicação do mencionado artigo do CTN.
Esse entendimento ficou claro no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) nº 350.446, no qual o ministro Nelson Jobim enfatizou que a diferença entre alíquota zero e isenção é mais teórica do que prática, já que ambas resultam no não recolhimento do tributo.
A alíquota zero, assim como a isenção, possui um caráter extra-arrecadatório, sendo um instrumento para intervenção na economia, seja para estimular a produção ou aumentar a competitividade de determinados produtos/serviços no mercado.
Segundo o ministro, não reconhecer para a alíquota zero o que já é aceito para a isenção significaria invalidar um importante instrumento de política governamental, que produz efeitos similares aos da isenção.
Spacca
Dessa forma, a regra do artigo 178 do CTN, que veda a revogação ou modificação da isenção condicionada ou por prazo certo, deve ser aplicável também à norma que institui alíquota zero. Isso é especialmente relevante no caso do Perse, cuja instituição do benefício fiscal ocorreu por meio de lei, da mesma forma exigida para a isenção.
Mudando as regras com o jogo em andamento
Vale destacar ainda que fazer distinção entre alíquota zero e isenção, nesses casos, é dar carta branco ao Estado para que utilize o instituto da alíquota zero como subterfúgio a fim de afastar a aplicação do artigo 178 do CTN.
Outro ponto que não merece ser ignorado, especialmente no caso do Perse, é que o estabelecimento de um prazo para a alíquota zero (leia-se isenção) permite que o Governo planejamento seu orçamento fiscal levando em consideração essa renúncia fiscal até seu prazo final. Dito de outro modo, a mudança abrupta da política fiscal com a tentativa de revogação do Perse apenas demonstra a irresponsabilidade do governo.
Tal ação não apenas afeta a confiança dos contribuintes e investidores na estabilidade das políticas fiscais, mas também levanta preocupações sobre a previsibilidade e a segurança jurídica das decisões governamentais, fundamentais para um ambiente econômico saudável.
Portanto, considerando a interpretação do STF, a tentativa de revogação dos benefícios fiscais do Perse, seja pela MP n° 1202/2023 ou por qualquer outra medida que venha a substituí-la, não parece juridicamente válida.
A alíquota zero, no contexto do Perse, não pode ser revogada antes do prazo estabelecido, garantindo assim a segurança jurídica e a confiabilidade das políticas fiscais implementadas para a recuperação de setores vitais da economia impactados pela pandemia. Não se pode mudar as regras com o jogo em andamento.