
O debate em torno da tributação de transmissões com elemento internacional volta à cena com o julgamento do RE 1.553.620/SP, relatado pela Ministra Cármen Lúcia e julgado em 14 de junho de 2025. A Suprema Corte negou provimento ao recurso do Estado de São Paulo, mantendo acórdão do TJSP que afastara a cobrança do ITCMD sobre doações provenientes do exterior.
A decisão reafirma, em linhas firmes, a tese já consolidada no Tema 825 de repercussão geral (RE 851.108): os Estados e o Distrito Federal não possuem competência para instituir o ITCMD nas hipóteses do art. 155, §1º, III, da Constituição Federal sem lei complementar federal que discipline a matéria.
O Estado de São Paulo sustentou que a Emenda Constitucional nº 132/2023, fruto da reforma tributária, teria eliminado a omissão normativa, permitindo desde logo a tributação. O STF, contudo, foi categórico em dois aspectos:
A mera alteração constitucional não supre a ausência de lei complementar federal – a exigência de norma nacional continua sendo condição necessária para que Estados possam exercer a competência tributária.
A legislação paulista permanece inválida – o art. 4º da Lei nº 10.705/2000, que previa a tributação de transmissões com elemento internacional, foi declarado inconstitucional pelo STF na ADI 6.830/SP, e não pode ser ressuscitado por alteração constitucional superveniente.
O Projeto de Lei Complementar nº 108, atualmente em tramitação no Congresso Nacional, pretende justamente suprir essa lacuna normativa. Mas, mesmo que seja aprovado, sua eficácia em São Paulo dependerá de um novo processo legislativo estadual, já que a lei vigente teve seus dispositivos declarados inconstitucionais.
Esse ponto é decisivo: a exigência do ITCMD em doações vindas do exterior somente poderá ocorrer após:
a edição da lei complementar federal, e
a adequação da lei estadual, respeitando os parâmetros constitucionais.
Até lá, qualquer tentativa de cobrança permanece sem base legal.
O caso paulista ilustra a tensão clássica entre apetite arrecadatório e respeito ao processo legislativo. A EC 132/2023 buscou redesenhar a tributação patrimonial, mas não eliminou os limites constitucionais da legalidade estrita. A pressa em arrecadar não autoriza Estados a tributar sem a devida cadeia normativa.
O STF, ao reafirmar o Tema 825, enviou uma mensagem clara: a reforma tributária não é cheque em branco para os Estados. O sistema constitucional continua exigindo a sequência formal — Constituição, lei complementar e lei ordinária estadual.
Apesar da inovação trazida pela EC 132/2023, o ITCMD sobre doações vindas do exterior permanece inexigível em São Paulo. A tributação só será possível após o Congresso aprovar a lei complementar (PLP 108) e o Estado editar nova lei ordinária.
Na prática, enquanto essa etapa não for cumprida, doações internacionais continuam fora do alcance do ITCMD em São Paulo, preservando a orientação jurisprudencial consolidada.