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REARP: atualização e regularização patrimonial com alíquota reduzida – o que muda com a Lei 15.265/2025

25/11/2025

Guilherme Chambarelli

A Lei 15.265/2025 criou o REARP, permitindo atualizar imóveis e bens com IR reduzido e regularizar ativos não declarados no Brasil e no exterior, com remissão de créditos e efeitos penais relevantes. Entenda oportunidades, riscos e como planejar.


REARP: a nova janela para atualizar e regularizar patrimônio sob a Lei 15.265/2025

A Lei nº 15.265, de 21 de novembro de 2025, inaugurou um novo capítulo na relação entre Fisco e contribuintes ao instituir o Regime Especial de Atualização e Regularização Patrimonial (REARP). Ao mesmo tempo em que abre uma janela para atualização de imóveis e bens registrados com alíquotas de Imposto de Renda substancialmente reduzidas, também cria um canal para regularização de ativos não declarados – no Brasil e no exterior –, com efeitos tributários e penais relevantes.

O REARP não vem sozinho: a mesma lei endurece regras de compensação tributária, altera a tributação de empréstimos de títulos e operações de hedge, e ajusta dispositivos previdenciários e setoriais. Mas, para empresários, famílias empresárias e pessoas físicas com patrimônio relevante, o ponto central é claro: tratar hoje o que, se permanecer na penumbra, tende a se tornar problema caro – e, em alguns casos, penal – amanhã.


1. O que é o REARP e qual é a lógica do regime?

O REARP é um regime especial, facultativo, com duas portas de entrada distintas:

  1. Atualização de bens já declarados (imóveis e bens móveis sujeitos a registro – veículos, embarcações, aeronaves), com alíquota reduzida;
  2. Regularização de bens e direitos não declarados, ou declarados com omissões ou incorreções em dados essenciais (incluindo ativos no exterior), com tributação concentrada e remissão de créditos tributários e efeitos penais.

A lógica econômica é semelhante à de programas anteriores (como RERCT e RERCT-Geral), combinando: arrecadação imediata, saneamento de bases cadastrais e fortalecimento da capacidade de fiscalização futura. Para o contribuinte, o trade-off é pagar agora, em condições especiais, para reduzir incerteza tributária e criminal em relação a fatos pretéritos.


2. Atualização de bens com alíquota reduzida

2.1. Pessoas físicas: 4% sobre a diferença entre custo e valor de mercado

Pessoas físicas residentes no Brasil podem atualizar o valor de:

  • imóveis (no Brasil ou no exterior); e
  • bens móveis automotores sujeitos a registro público (veículos, embarcações, aeronaves),

adquiridos até 31.12.2024, desde que já constem da Declaração de Ajuste Anual do IRPF.

O contribuinte informa o valor de mercado na data da opção. A diferença entre o valor atualizado e o custo de aquisição é tratada como acréscimo patrimonial e tributada à alíquota definitiva de 4% de IR – sem qualquer redução ou benefício adicional.

Hoje, uma venda de imóvel, em regra, está sujeita à tributação de ganho de capital entre 15% e 22,5%, conforme o valor do ganho. Com o REARP, é possível “pré-pagar” 4% sobre a diferença entre custo histórico e valor de mercado, redefinindo a base de custo para fins de futuras alienações.

Há um detalhe estrutural relevante: para fins da Lei 7.713/1988 e da Lei 11.196/2005, a data de aquisição passa a ser a data da opção, reabrindo a contagem para regras específicas de ganho de capital e eventuais incentivos vinculados ao tempo de permanência do ativo.

Em termos práticos, a conta que precisa ser feita é:

“Se eu for vender este imóvel em 2–5 anos, quanto pagaria de IR com a regra geral? Pagar 4% agora é mais barato do que pagar 15–22,5% depois, sobre uma base possivelmente ainda maior?”

É aqui que entra o papel de modelagem numérica e tributária – caso a caso.


2.2. Pessoas jurídicas: atualização de ativo imobilizado com IRPJ e CSLL totais de 8%

Pessoas jurídicas podem atualizar para o valor de mercado os bens (imóveis e bens móveis sujeitos a registro) constantes do ativo permanente do balanço de 31.12.2024. A diferença entre o custo contábil e o valor de mercado será tributada à alíquota definitiva de:

  • 4,8% de IRPJ; e
  • 3,2% de CSLL,

totalizando 8%.

A lei, porém, impede que essa diferença seja depreciada para fins fiscais – ou seja, não há benefício em termos de dedutibilidade futura. A atualização tem função principalmente de:

  • “limpar” balanços subavaliados;
  • alinhar demonstrações financeiras à realidade econômica;
  • preparar reorganizações societárias, cisões, incorporações e reorganizações patrimoniais;
  • viabilizar operações de M&A, entrada de investidor ou reorganização sucessória com valores mais próximos de mercado.

Para grupos societários, holdings patrimoniais e empresas com forte componente imobiliário, a decisão envolve confrontar o custo imediato (8%) com os efeitos futuros em reorganizações, alienações, distribuição de resultados e ITCMD na sucessão.


2.3. Condições, travas e migração da lei anterior

A lei estabelece algumas travas que funcionam como condições resolutivas do benefício:

  • Se o bem atualizado for alienado antes de 5 anos (imóvel) ou 2 anos (bem móvel) contados da adesão (exceto por causa mortis ou partilha de divórcio/união estável), os efeitos do REARP são desconsiderados.
  • Nesse cenário, o ganho de capital / lucro é recalculado como se não houvesse atualização, cobrando-se o IR/IRPJ/CSLL devidos, com atualização pela Selic, abatendo o que já tiver sido pago no REARP.

Além disso, a lei permite que contribuintes que aderiram à atualização de bens imobiliários pela Lei 14.973/2024 migrem para o novo regime, conforme regulamento da Receita Federal.

Em outras palavras: o REARP cria um “lock-up fiscal” mínimo. Utilizar o regime exige que o contribuinte esteja confortável em manter o ativo pelo prazo legal, sob pena de perder parte da vantagem econômica.


3. Regularização de bens e direitos não declarados (Brasil e exterior)

A segunda porta do REARP mira recursos, bens e direitos de origem lícita que não foram devidamente declarados (ou foram declarados com omissão ou incorreção em dados essenciais) até 31.12.2024.

3.1. Abrangência e carga tributária

O rol de bens e direitos é amplo e inclui, entre outros:

  • depósitos bancários, fundos de investimento, aplicações financeiras em geral;
  • operações de empréstimo com pessoas físicas ou jurídicas;
  • participações societárias (quotas, ações, participações em sociedades com ou sem personalidade jurídica);
  • ativos intangíveis: marcas, patentes, softwares, know-how, royalties;
  • criptoativos e demais ativos virtuais, conforme a Lei 14.478/2022;
  • imóveis e direitos sobre imóveis;
  • veículos, aeronaves, embarcações e outros bens sujeitos a registro;
  • bens que já não existam mais na data de corte, desde que comprovados por documentação idônea.

A carga tributária é estruturada da seguinte forma:

  • o montante dos ativos é considerado acréscimo patrimonial em 31.12.2024;
  • aplica-se IR sobre ganho de capital à alíquota única de 15% sobre esse montante;
  • sobre o valor do IR, incide multa de 100% (art. 11);

Na prática, a carga total é de 30% sobre o valor regularizado, reproduzindo a lógica de regimes anteriores de regularização, mas agora com recorte temporal em 31.12.2024 e integração à realidade mais recente de fiscalização (intercâmbio internacional de informações financeiras, criptoativos, etc.).


3.2. Efeitos tributários e penais

Ao optar pela regularização, entregar a declaração específica e pagar o IR + multa, o contribuinte obtém:

  • Remissão de créditos tributários diretamente relacionados aos bens e direitos regularizados, relativamente a fatos geradores até 31.12.2024 (com exceção de tributos retidos na fonte e não recolhidos).
  • Dispensa de acréscimos moratórios anteriores à adesão sobre o imposto devido.
  • Extinção da punibilidade em relação a crimes contra a ordem tributária (Lei 8.137/1990, art. 1º e art. 2º, I, II e V, e Lei 4.729/1965), desde que o pagamento integral ocorra antes de sentença penal condenatória transitada em julgado.
  • Suspensão da pretensão punitiva enquanto perdurar o parcelamento (até 36 meses), se este for requerido antes do recebimento da denúncia.

Por outro lado, a lei deixa claro que:

  • o contribuinte assume confissão irrevogável e irretratável dos débitos;
  • a adesão importa aceitação plena das condições legais;
  • informações prestadas com falsidade ou incompatíveis com documentação podem levar à exclusão do regime, com cobrança integral de tributos, multas e juros “cheios”, sem prejuízo de responsabilização penal e administrativa.

3.3. Quem não pode aderir e quais são os riscos?

Alguns limites importantes:

  • A lei não se aplica a quem já tenha sido condenado por crimes contra a ordem tributária listados no art. 13 (ainda que o objeto seja exatamente o bem que se pretende regularizar).
  • Contribuintes que apresentarem documentos falsos ou avaliações de ativos em desacordo com o valor de mercado podem ser excluídos e responder civil, administrativa e penalmente.
  • A origem dos recursos precisa ser lícita – ativos derivados de corrupção, tráfico, lavagem ligada a crimes antecedentes específicos, por exemplo, não são alcançados pelo benefício.

Além disso, há uma exigência probatória robusta: o contribuinte deve manter, por pelo menos cinco anos após eventual alienação futura, a documentação que comprova valor, origem e titularidade dos bens e direitos regularizados.


4. Prazos, pagamento e operacionalização

A adesão ao REARP – tanto para atualização quanto para regularização – deve ocorrer em até 90 dias corridos a partir da publicação da lei (21.11.2025). Na prática, isso coloca o prazo final em 19 de fevereiro de 2026, considerando a contagem contínua.

Alguns pontos objetivos:

  • A opção se dá mediante declaração específica à Receita Federal, em modelo e sistema que ainda serão disciplinados por ato infralegal.
  • O pagamento pode ser em quota única ou em até 36 quotas mensais e sucessivas.
  • Nenhuma quota pode ser inferior a R$ 1.000,00; valores totais de IR inferiores a R$ 2.000,00 devem ser pagos à vista.
  • A primeira quota é paga até o último dia útil do mês de apresentação da declaração; as demais sofrem acréscimo de juros equivalentes à taxa Selic.
  • A tributação é definitiva, sem direito à restituição de valores anteriormente pagos.

Em paralelo, os bens e direitos regularizados devem ser refletidos:

  • na DIRPF de 2024 (ou retificadora), para pessoas físicas;
  • na escrituração contábil societária do ano-calendário da adesão, para pessoas jurídicas.

5. Quando faz sentido aderir? Cenários práticos

A decisão de aderir ao REARP não é automática. Ela depende de diagnóstico minucioso, simulações e leitura estratégica do contexto patrimonial e sucessório. Alguns exemplos típicos:

5.1. Pessoas físicas com imóveis muito defasados

  • Imóvel adquirido há 20 anos por R$ 500 mil, hoje avaliado em R$ 3 milhões.
  • Atualizar pelo REARP implica tributar 4% sobre R$ 2,5 milhões = R$ 100 mil.
  • Sem REARP, uma venda futura poderia gerar IR entre 15% e 22,5% sobre o ganho de capital, potencialmente muito superior, sobretudo se o mercado continuar aquecido.

Para quem pretende vender nos próximos anos – e pode respeitar o “lock-up” de 5 anos – a atualização tende a ser economicamente vantajosa.

5.2. Holdings imobiliárias e empresas operacionais com ativo imobilizado

  • Empresas que utilizam imóveis operacionais ou patrimoniais subavaliados em balanço;
  • estruturas de “holding de controle” de famílias empresárias;
  • sociedades com planos de cisão, incorporação ou venda de ativos específicos.

A atualização a 8% pode:

  • facilitar reorganizações, trazendo os valores a patamares mais próximos de laudo de avaliação;
  • reduzir espaço para questionamentos de subavaliação no contexto de ITCMD, ITBI e preço de transferência em transações intragrupo;
  • melhorar a “foto” do patrimônio líquido para fins de covenants bancários e entrada de investidores.

Por outro lado, perde-se o benefício de depreciação fiscal da parcela atualizada, o que precisa ser mensurado.

5.3. Regularização de ativos no exterior, criptoativos e estruturas complexas

O REARP também é claramente direcionado a:

  • contas e investimentos no exterior mantidos fora do radar fiscal;
  • participações em offshores, trusts, fundações e estruturas fiduciárias em jurisdições diversas;
  • criptoativos mantidos em carteiras não declaradas, tanto em exchanges estrangeiras como em self-custody;
  • empréstimos entre partes relacionadas não corretamente refletidos em obrigações acessórias.

Aqui, a questão central é menos “pagar 30% é caro ou barato?” e mais “qual é o custo de não fazer nada em um ambiente de cooperação internacional, blockchain rastreável e intensificação do cruzamento de dados?”

Programas anteriores mostraram que a Receita tende a tratar a adesão como divisor de águas: quem se regulariza entra numa espécie de “anistia condicionada”; quem não se regulariza torna-se alvo natural das próximas fases de fiscalização.


6. Impactos colaterais: compensação, empréstimo de títulos e hedge

Ainda que o foco deste artigo seja o REARP, é importante registrar o contexto: a Lei 15.265/2025 também:

  • endurece as regras de compensação tributária (art. 74 da Lei 9.430/1996), vedando créditos oriundos de DARF inexistente e restringindo compensações de PIS/Cofins sem relação com a atividade da empresa;
  • reorganiza a tributação de empréstimos de títulos e valores mobiliários, ajustando a incidência de IRRF e a alocação de rendimentos e reembolsos entre emprestador e tomador;
  • redefine a forma de computar resultados de operações de hedge com contrapartes no exterior para fins de IRPJ e CSLL, vinculando o reconhecimento de prejuízos a operações a preços de mercado e registradas em entidades aptas a aferir consistência de preços.

Para grupos empresariais com operações financeiras sofisticadas, o pacote normativo exige revisão integrada: não basta olhar a janela de regularização patrimonial; é preciso reavaliar estratégias de compensação, estruturação de operações com derivativos e empréstimo de ativos financeiros.


7. Como o Chambarelli Advogados pode apoiar

O REARP é, ao mesmo tempo, uma oportunidade de saneamento patrimonial e um terreno de armadilhas jurídicas, tributárias e penais. A diferença entre capturar o benefício econômico e expor o contribuinte a novos riscos está na arquitetura jurídica da adesão.

No Chambarelli Advogados, nossa atuação envolve:

  • Diagnóstico patrimonial e societário: mapeamento de bens, direitos e estruturas (Brasil e exterior), identificação de ativos elegíveis e de passivos tributários e penais associados.
  • Simulações econômico-tributárias: comparação entre cenários com e sem REARP (curto, médio e longo prazo), inclusive sob a ótica sucessória e de reorganizações societárias.
  • Desenho de estratégia de adesão: definição de quais bens atualizar, quais regularizar, se há conveniência em migrar regimes anteriores, e como articular o REARP com outras medidas (planejamento sucessório, reorganizações internas, blindagem patrimonial lícita).
  • Suporte probatório e de compliance: orientação sobre documentação mínima, laudos de avaliação, comprovação de origem lícita e adequação das informações declaradas, mitigando o risco de exclusão do regime.
  • Coordenação com contabilidade e family office: alinhamento entre a declaração ao Fisco, escrituração contábil, demonstrações financeiras e governança corporativa.

Mais do que “aproveitar uma alíquota reduzida”, tratar o REARP como vetor de reorganização estrutural do patrimônio é o que separa um movimento emergencial de uma decisão de longo prazo.

Se você é empresário, gestor de patrimônio ou responsável por estruturas societárias complexas, este é o momento de olhar com lupa para o seu mapa patrimonial e decidir, com base em dados e estratégia, como atravessar essa nova fase da relação Fisco-contribuinte.

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