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Simples Nacional – Exclusão das gorjetas da base de cálculo: como reduzir tributos e recuperar valores pagos indevidamente

28/10/2025

Guilherme Chambarelli

Empresas optantes pelo Simples Nacional podem excluir as gorjetas da base de cálculo dos tributos do regime unificado, pois esses valores não representam receita bruta do empregador, mas remuneração dos funcionários. A tese é reconhecida pelo STJ e pelos cinco TRFs e permite reduzir a carga tributária e recuperar valores pagos indevidamente nos últimos 5 anos, atualizados pela SELIC.


O que está sendo discutido

O Simples Nacional é um regime simplificado que unifica tributos federais, estaduais e municipais em um único recolhimento. Sua base de cálculo é a receita bruta da empresa, nos termos da Lei Complementar nº 123/2006.

O problema surge quando a Receita Federal exige que as gorjetas pagas pelos clientes sejam incluídas nessa base de cálculo, mesmo que esses valores sejam integralmente repassados aos empregados.

A tese sustenta que essa exigência é ilegal e inconstitucional, pois as gorjetas não configuram receita nem faturamento da empresa, mas verba salarial dos funcionários, conforme art. 457 da CLT e Súmula 354 do TST.


Fundamento jurídico: receita x repasse

1. Natureza jurídica das gorjetas

O art. 457 da CLT é claro:

“Compreendem-se na remuneração do empregado, para todos os efeitos legais, além do salário devido e pago diretamente pelo empregador, as gorjetas que receber.”

Assim, o valor pago pelo cliente não ingressa no patrimônio do empregador — ele apenas transita no caixa, com destinação certa aos trabalhadores.

A Súmula 354 do TST reforça:

“As gorjetas […] integram a remuneração do empregado […] não servindo de base de cálculo para parcelas de aviso-prévio, adicional noturno, horas extras e repouso semanal remunerado.”

Logo, o empregador é mero intermediário, e o valor não gera acréscimo patrimonial, requisito essencial para caracterizar receita bruta.


2. Conceito de receita bruta

A LC nº 123/2006, art. 3º, §1º, define:

“Considera-se receita bruta o produto da venda de bens e serviços nas operações de conta própria […]”.

E o Decreto-Lei nº 1.598/1977, art. 12, complementa:

“Somente os ingressos que se incorporam definitivamente ao patrimônio da pessoa jurídica […] constituem receita bruta.”

As gorjetas não se incorporam ao patrimônio da empresa, não representam contraprestação por bens ou serviços e não revelam capacidade contributiva (art. 145, §1º, CF).
São, portanto, ingressos transitórios — e não podem compor a base de cálculo dos tributos do Simples Nacional.


Precedentes do STJ e TRFs

O Superior Tribunal de Justiça consolidou o entendimento de que gorjetas não se enquadram em receita, faturamento ou lucro e não sofrem incidência de tributos sobre receita.

STJ – REsp 1.834.375/PE, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho (2020)

“As gorjetas possuem natureza salarial, independentemente de serem pagas voluntária ou compulsoriamente […], não podendo ser incluídas na base de cálculo do PIS, COFINS, IRPJ e CSLL.”

Os Tribunais Regionais Federais das cinco regiões estendem esse raciocínio ao Simples Nacional, reconhecendo a ilegalidade da exigência:

Tribunal Entendimento
TRF1 Gorjetas não configuram receita, pois o empregador é mero depositário; é ilegal incluí-las na base do Simples Nacional.
TRF2 A gorjeta tem natureza salarial e destina-se aos empregados; não constitui receita própria do contribuinte.
TRF3 A jurisprudência do STJ é aplicável ao Simples Nacional; gorjetas não integram a receita bruta.
TRF4 Ingresso transitório, sem acréscimo patrimonial; ilegítima a exigência de tributos sobre gorjetas.
TRF5 Inexistência de relação jurídico-tributária que obrigue a inclusão de gorjetas na base do Simples Nacional.

Relação com o Tema 69 do STF

A lógica dessa tese segue o mesmo fundamento constitucional do Tema 69 (RE 574.706/PR), em que o STF decidiu que o ICMS não compõe a base do PIS/Cofins porque não é receita do contribuinte.
No caso das gorjetas, aplica-se o mesmo raciocínio:

“Se alguém fatura a gorjeta, esse alguém é o empregado — e não o empregador.”


Efeitos práticos da exclusão

1. Redução imediata da carga tributária

As empresas podem excluir as gorjetas da base de cálculo do Simples Nacional, diminuindo o valor do DAS (Documento de Arrecadação do Simples Nacional).

2. Recuperação de valores pagos indevidamente

É possível recuperar os últimos 5 anos, com atualização pela taxa SELIC, conforme art. 165 e 168 do CTN e art. 21, §11 da LC 123/2006.

Fórmula estimada:

(Alíquota média do Simples Nacional × total de gorjetas dos últimos 5 anos) + atualização SELIC


Procedimento recomendado

  1. Diagnóstico fiscal e contábil:
    Levantamento do valor total de gorjetas declaradas em notas e folhas de pagamento.

  2. Cálculo do crédito:
    Identificação da fração indevida recolhida e projeção da restituição com SELIC.

  3. Ação judicial (mandado de segurança):
    Reconhecimento da não incidência e do direito à compensação administrativa.

  4. Compensação no âmbito do Simples Nacional:
    Permitida apenas para débitos do mesmo ente e tributo, conforme art. 21, §11 da LC 123/2006 e Resolução CGSN 140/2018.


Base normativa essencial

  • Art. 457 da CLT – gorjeta integra remuneração do empregado.

  • Súmula 354/TST – gorjeta tem natureza salarial.

  • Art. 3º, §1º, e art. 18, §3º, da LC 123/2006 – conceito de receita bruta.

  • Art. 12 do DL 1.598/1977 – define receita bruta.

  • Art. 145, §1º, CF – princípio da capacidade contributiva.

  • Art. 110 do CTN – impede distorção de conceitos de direito privado para ampliar competência tributária.

  • Tema 69/STF – exclusão do ICMS da base do PIS/Cofins.

  • Súmula 213/STJ – mandado de segurança é via adequada para declaração de compensação tributária.


Panorama e perspectivas

A tese é madura, pacificada e de aplicação imediata.
As decisões do STJ e dos cinco TRFs formam jurisprudência uniforme, e a União vem perdendo sistematicamente nas ações individuais.

Com base nesse cenário, as empresas optantes do Simples Nacional podem propor ações preventivas ou restitutórias para parar de pagar o indevido e recuperar o que já foi pago.


Conclusão

A inclusão das gorjetas na base de cálculo do Simples Nacional é incompatível com o conceito de receita, com a legislação trabalhista e com a jurisprudência consolidada dos tribunais.

Reconhecer a não incidência e promover a recuperação dos valores pagos indevidamente é medida de justiça fiscal e eficiência econômica, especialmente para bares, restaurantes, hotéis e estabelecimentos de serviços, onde as gorjetas são parte estrutural da remuneração.


Chambarelli Advogados

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