
A produção de vídeos no Brasil para exibição em redes sociais estrangeiras tem gerado importantes questionamentos tributários, especialmente quando os conteúdos são consumidos exclusivamente por usuários residentes no exterior e remunerados em moeda estrangeira. Diante da crescente internacionalização da economia digital, é cada vez mais relevante compreender quando se configura, efetivamente, uma exportação de serviços para fins tributários.
Do ponto de vista jurídico-tributário, a resposta a essa indagação não é meramente formal. A Constituição Federal, em seu artigo 149, §2º, inciso I, estabelece a imunidade das receitas decorrentes de exportações em relação à incidência de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico. No entanto, essa imunidade depende da correta caracterização do serviço como efetivamente exportado.
No caso de prestadoras brasileiras que criam vídeos com recursos próprios, em território nacional, mas cujo destino exclusivo são plataformas digitais acessadas por estrangeiros, a lógica constitucional da imunidade se impõe. O serviço é concebido, produzido e finalizado no Brasil, mas a sua fruição, a demanda que o justifica, reside fora do país. Trata-se de uma prestação que se volta ao mercado externo, em favor de tomadores que não possuem domicílio fiscal no território nacional.
Essa interpretação, já consolidada pelo Parecer Normativo COSIT nº 1/2018, adota uma abordagem substancialista. Não se exige o deslocamento físico do prestador, tampouco a transposição de bens tangíveis. Basta que os elementos essenciais da relação de consumo do serviço estejam localizados no exterior, com a atuação do tomador como agente demandante da atividade.
Importa pouco, nesse contexto, se a plataforma digital intermediária possui ou não sede no Brasil. O que define a natureza da operação é a localização do tomador final e a destinação do serviço. Se os vídeos são encomendados ou acessados exclusivamente por residentes no exterior, e a remuneração ocorre mediante ingresso de divisas ou manutenção autorizada de valores em contas no exterior, a exportação de fato se configura.
A implicação prática dessa qualificação é a exclusão das receitas correspondentes da base de cálculo de diversas contribuições, como PIS, Cofins e ISS. Ademais, no regime do Simples Nacional, essas receitas devem ser segregadas das operações no mercado interno, conforme previsto no artigo 25 da Resolução CGSN nº 140/2018, o que afeta diretamente a apuração dos tributos unificados devidos.
A prestação de serviços digitais transcende as fronteiras físicas e desafia a aplicação de normas tributárias tradicionalmente estruturadas em torno da territorialidade. O reconhecimento jurídico da exportação nesses casos representa uma adaptação necessária às dinâmicas da economia contemporânea. Negar esse enquadramento implicaria tributar uma receita que, por definição constitucional, deveria ser incentivada e protegida.
Ao produzir vídeos com fins estritamente externos, a empresa brasileira não apenas gera divisas, mas atua como agente de inserção econômica internacional. O sistema tributário, ao reconhecer essa condição, não promove um favor fiscal, mas apenas concretiza o comando da Constituição de estimular as exportações e evitar distorções que penalizem o empreendedor que projeta sua atividade para além do mercado interno.
A interpretação correta da natureza da prestação é, portanto, elemento central para a segurança jurídica das empresas da nova economia. E, neste cenário, a coerência entre a Constituição, os pareceres normativos e os atos infralegais representa um avanço importante rumo à harmonização entre norma e realidade econômica.
26/06/2025
Guilherme Chambarelli
02/07/2025
Guilherme Chambarelli
26/06/2025
Guilherme Chambarelli