
Entenda a disputa em torno do Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) e como empresas buscam no Judiciário a manutenção da alíquota zero até 2027.
O Programa Emergencial de Retomada do Setor de Eventos (PERSE) foi instituído pela Lei nº 14.148/2021 como resposta aos impactos devastadores da pandemia sobre eventos, turismo e entretenimento. O regime prometeu a redução a zero de IRPJ, CSLL, PIS e COFINS por 60 meses, garantindo fôlego financeiro a empresas que, em muitos casos, chegaram à beira da insolvência.
Contudo, alterações legislativas posteriores – notadamente a Lei nº 14.859/2024 e a edição da Instrução Normativa RFB nº 2.195/2024 – introduziram restrições que comprometeram a previsibilidade do benefício. Ao impor limites de renúncia fiscal e condicionar a habilitação a novos requisitos, o Estado abriu um flanco de insegurança jurídica, obrigando empresas a recorrerem ao Judiciário para assegurar a continuidade da desoneração até fevereiro de 2027, como previsto originalmente.
Nesse cenário, uma decisão obtida pelo Chambarelli Advogados em favor de uma empresa de agenciamento de atletas profissionais (processo nº 5002027-22.2025.4.02.5101) firmou um precedente de grande relevância. A 34ª Vara Federal do Rio de Janeiro reconheceu que a alteração promovida pela Lei nº 14.859/2024 viola o artigo 178 do Código Tributário Nacional e a Súmula 544 do STF, assegurando à impetrante o direito de continuar usufruindo da alíquota zero até 2027.
A sentença, assinada pela Juíza Federal Simone de Fátima Diniz Bretas, ganhou destaque na imprensa jurídica, sendo noticiada tanto no ConJur quanto no JOTA, ampliando o debate sobre os limites da atuação do legislador na revisão de benefícios fiscais previamente concedidos por prazo certo e mediante condições onerosas.
O cerne da disputa repousa na distinção doutrinária entre isenção e alíquota zero. A Receita Federal sustenta que o benefício do PERSE seria mera alíquota zero, instituto passível de revogação sem a proteção do art. 178 do CTN. O Judiciário, entretanto, vem consolidando o entendimento de que a exoneração, ao ser concedida por prazo certo e sob condições onerosas – como habilitação formal, enquadramento em CNAE específico e regularidade fiscal –, reveste-se das mesmas características de uma isenção condicionada, blindada contra supressões arbitrárias.
Tal interpretação reforça a ideia de que não se trata de um privilégio gracioso, mas de um incentivo setorial, concedido mediante contrapartidas dos contribuintes e que não pode ser reduzido unilateralmente pelo Estado antes do prazo originalmente pactuado.
O caso expõe uma tensão clássica do sistema tributário brasileiro: a busca por equilíbrio fiscal de um lado e a necessidade de segurança jurídica de outro. Se, por um lado, é legítimo ao Estado rever políticas de renúncia, por outro, a supressão de benefícios concedidos por prazo certo mina a confiança dos contribuintes, viola a boa-fé objetiva e compromete a estabilidade das relações econômicas.
A sentença da Justiça Federal do Rio de Janeiro ecoa justamente nesse ponto: empresas que remodelaram sua estrutura financeira e assumiram compromissos contando com a vigência do PERSE até 2027 não podem ser surpreendidas com a retirada abrupta do incentivo. O princípio da proteção da confiança legítima, derivado do Estado de Direito (art. 1º da CF/88), exige que o legislador respeite expectativas juridicamente consolidadas.
O debate sobre o PERSE transcende a questão setorial e se insere em uma discussão mais ampla sobre a qualidade do ambiente regulatório brasileiro. Ao garantir a manutenção do benefício fiscal até 2027, a decisão judicial reafirma que a previsibilidade tributária não é concessão política, mas um imperativo de justiça fiscal.
Para o setor de eventos, a batalha judicial pela preservação do PERSE representa não apenas a defesa de um incentivo, mas a própria sobrevivência econômica de milhares de empresas. Para o Direito Tributário, o caso reafirma a centralidade da segurança jurídica como vetor interpretativo, capaz de conter avanços arbitrários do poder público sobre legítimas expectativas privadas.
01/05/2025
Guilherme Chambarelli
12/03/2024
Guilherme Chambarelli
23/08/2025
Guilherme Chambarelli