
A exportação de serviços, apesar de frequentemente associada a benefícios fiscais no ordenamento brasileiro, exige análise técnica cuidadosa para que a desoneração do PIS e da Cofins seja corretamente aplicada. A legislação estabelece requisitos específicos que nem sempre são observados de forma clara pelos contribuintes, o que tem levado a controvérsias e insegurança jurídica em diversos setores, especialmente naqueles que operam com tomadores estrangeiros por meio de representantes no Brasil.
O ponto central da controvérsia reside na caracterização do que se entende por exportação de serviços, para fins de aplicação da não incidência ou isenção das contribuições. A legislação aplicável exige, cumulativamente, que (i) o tomador do serviço esteja domiciliado no exterior e (ii) o pagamento represente efetivo ingresso de divisas no País. Essas condições estão positivadas no art. 5º, II, da Lei nº 10.637/2002 (PIS), no art. 6º, II, da Lei nº 10.833/2003 (Cofins) e no art. 14, III, da MP nº 2.158-35/2001.
A primeira condição, relativa à localização do tomador, tem interpretação objetiva: o contrato deve ser celebrado com pessoa física ou jurídica residente ou domiciliada no exterior. Não há, por ora, margem para subjetividade ou critérios vinculados ao local de execução do serviço. A segunda condição, por outro lado, exige a efetiva internalização de recursos oriundos do exterior, em conformidade com a regulamentação cambial vigente, o que impõe maior atenção por parte dos contribuintes, principalmente diante das constantes atualizações normativas do Banco Central.
Nesse contexto, duas recentes Soluções de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação merecem destaque por aprofundarem o entendimento técnico sobre o tema, sem, no entanto, apresentar uniformidade absoluta.
A primeira delas analisou uma operação em que os serviços foram prestados a tomador estrangeiro que realizou o pagamento mediante débito em conta mantida no Brasil, em moeda nacional, desde que essa conta estivesse devidamente registrada e operada nos termos da Resolução BCB nº 277/2022. A Receita Federal concluiu que, desde que atendidos os requisitos da regulação cambial — como o vínculo entre o pagamento e o contrato internacional, e a rastreabilidade da conversão cambial — há ingresso de divisas válido para fins de isenção.
Já a segunda manifestação tratou de operações portuárias realizadas para armadores estrangeiros, com intermediação de agências marítimas estabelecidas no Brasil. Nesse caso, o fisco reconheceu que a atuação de um mandatário — isto é, um representante legal que age em nome e por conta do tomador estrangeiro — não descaracteriza a natureza de exportação da operação, desde que o vínculo negocial com o exterior e o efetivo ingresso de divisas possam ser comprovados. Ainda assim, a Receita reforçou que se o pagamento for feito diretamente por empresa nacional que atua em nome próprio, a operação não será considerada exportação para fins fiscais, mesmo que o serviço atenda, indiretamente, ao interesse de empresa estrangeira.
Esses entendimentos, ainda que harmônicos em muitos pontos, revelam distinções relevantes. Na primeira hipótese, enfatiza-se a flexibilização das formas de ingresso de divisas e a prevalência do critério formal do domicílio do tomador. Na segunda, a atenção recai sobre o vínculo jurídico entre prestador e tomador, com foco na figura do mandatário e na autenticidade da relação contratual internacional.
Ambas as soluções de consulta, embora contenham vinculações parciais a decisões anteriores — como a Solução de Divergência COSIT nº 1/2017 — atualizam o debate à luz da Resolução BCB nº 277/2022, que ampliou as possibilidades cambiais e, por consequência, as formas de qualificação do ingresso de divisas. O cenário normativo atual permite, por exemplo, que pagamentos sejam realizados em reais no Brasil, desde que vinculados a uma operação de câmbio efetivada em momento anterior, concomitante ou posterior à prestação de serviços, desde que devidamente documentada.
Para empresas que operam no comércio internacional de serviços, o cuidado com a documentação contratual e com a formalização cambial é essencial. A caracterização como exportação, além de exigir o cumprimento de obrigações regulatórias, pode representar uma significativa economia tributária, ao afastar a incidência de contribuições que, somadas, alcançam 9,25% da receita bruta.
Na prática, isso exige não apenas a escolha criteriosa do modelo contratual com o tomador estrangeiro — privilegiando mandatos formais quando houver intermediação —, mas também a adoção de procedimentos internos que garantam a rastreabilidade da origem dos recursos e o seu vínculo inequívoco com a contraprestação do serviço. Não basta, por exemplo, receber valores em conta bancária nacional em nome de empresa brasileira se não houver comprovação do nexo causal com a prestação contratada com o tomador estrangeiro.
É igualmente relevante compreender que os benefícios fiscais não se aplicam a prestações de serviços contratadas com intermediários nacionais que atuem em nome próprio, ainda que a destinação do serviço seja para empresa no exterior. A Receita Federal reitera, nesse ponto, que a desoneração só incide sobre receitas efetivamente decorrentes de contratos internacionais, com respaldo documental e cambial robusto.
Diante desse panorama, a exportação de serviços segue como uma estratégia legítima de otimização tributária, mas demanda, do ponto de vista jurídico e contábil, precisão técnica, análise regulatória e diligência contratual. A orientação especializada, sobretudo na redação contratual e na estruturação das operações cambiais, é indispensável para que o contribuinte usufrua dos incentivos legais sem se expor a autuações fiscais futuras.
O escritório Chambarelli Advogados acompanha de perto a evolução do tema e está preparado para auxiliar empresas na estruturação jurídica e tributária de suas operações internacionais, assegurando conformidade e eficiência fiscal.
26/06/2025
Guilherme Chambarelli
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Guilherme Chambarelli
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Guilherme Chambarelli