
A Solução de Consulta COSIT nº 231/2024 marca um ponto de inflexão relevante na interpretação administrativa sobre o enquadramento fiscal dos serviços de assistência e internação domiciliar. Com base na jurisprudência firmada pelo Superior Tribunal de Justiça e no Parecer PGFN SEI nº 7.689/2021/ME, a Receita Federal passou a admitir, em caráter vinculante, a possibilidade de equiparação do home care aos serviços hospitalares para fins de tributação pelo lucro presumido, desde que observadas certas condições cumulativas.
O tema ganha especial importância diante do impacto direto na apuração do IRPJ e da CSLL. Em vez da aplicação do percentual genérico de 32% sobre a receita bruta, admite-se a tributação pelo percentual reduzido de 8% para o IRPJ e de 12% para a CSLL, desde que os serviços de home care estejam efetivamente voltados à promoção da saúde e sejam prestados por sociedade empresária que atenda às normas da Anvisa.
A controvérsia gira em torno da interpretação do conceito de serviços hospitalares. Historicamente, a Receita Federal aplicava um critério subjetivo, condicionando a fruição do benefício à existência de estrutura física própria e à prestação do serviço no interior de estabelecimentos hospitalares. Essa interpretação foi expressamente afastada pelo STJ no julgamento do Recurso Especial nº 1.116.399/BA, proferido sob a sistemática dos recursos repetitivos.
No entendimento do STJ, o elemento determinante para a qualificação do serviço como hospitalar é a sua natureza objetiva, ou seja, a atividade voltada diretamente à promoção da saúde, independentemente da estrutura física ou da titularidade do ambiente em que é prestado. O critério de análise deixa de ser o local da execução do serviço e passa a ser o conteúdo da atividade exercida.
Esse entendimento passou a vincular a atuação da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, que, por meio do Parecer SEI nº 7.689/2021/ME, reconheceu a impossibilidade de excluir os serviços de home care da tributação favorecida com base apenas na ausência de estrutura própria. O parecer também destaca que, embora a prestação em estrutura de terceiros possa indicar ausência de elemento de empresa, essa condição não é, por si só, impeditiva, desde que o prestador se organize como sociedade empresária e cumpra integralmente as normas sanitárias aplicáveis.
A Receita Federal consolidou essa orientação na Solução de Consulta COSIT nº 231/2024, ao reconhecer expressamente que os serviços de home care podem ser tributados com base nos percentuais reduzidos de presunção, desde que atendidos cumulativamente os seguintes requisitos: (i) a atividade esteja diretamente vinculada à promoção da saúde; (ii) a prestadora seja uma sociedade empresária; e (iii) os serviços estejam em conformidade com as normas da Anvisa, especialmente as constantes da RDC nº 50/2002.
A solução também reforça que o mero fato de a consulta ser respondida em sentido afirmativo não gera presunção de regularidade fiscal ou de atendimento aos requisitos, os quais devem ser comprovados pela empresa em eventual procedimento de fiscalização. Ou seja, trata-se de uma autorização condicionada à realidade fática da atividade, cuja legalidade poderá ser aferida em momento posterior pela Receita Federal.
Ainda que o reconhecimento administrativo represente um avanço, persistem riscos para empresas que operam com estruturas híbridas ou que não mantêm controle direto e permanente sobre os ambientes em que os serviços são executados. A fiscalização poderá desconsiderar o enquadramento caso verifique ausência de autonomia empresarial, de responsabilidade técnica direta ou de regularidade sanitária.
Por outro lado, para as empresas que cumprem rigorosamente os requisitos legais e sanitários, a equiparação hospitalar representa uma relevante oportunidade de planejamento tributário e até mesmo de recuperação de valores indevidamente recolhidos nos últimos cinco anos, mediante pedido de restituição ou compensação.
O reconhecimento da natureza hospitalar dos serviços de home care não é apenas uma questão técnica tributária. Trata-se do reconhecimento da centralidade dessas atividades na política pública de saúde, da sua essencialidade e da necessidade de garantir condições fiscais compatíveis com sua relevância social.
O escritório Chambarelli Advogados orienta empresas da área da saúde na estruturação jurídica e regulatória necessária à aplicação segura do regime de tributação favorecido, prestando assessoria estratégica tanto na fase preventiva quanto na busca de recuperação de créditos tributários.
16/11/2022
Guilherme Chambarelli
27/06/2025
Guilherme Chambarelli
17/04/2023
Guilherme Chambarelli