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Compensação de indébitos e tributação reflexa: a Solução de Consulta nº 4055/2025 e a consolidação do entendimento da Receita Federal

14/10/2025

Guilherme Chambarelli

A Solução de Consulta Disit/SRRF04 nº 4055, publicada no Diário Oficial da União em 14 de outubro de 2025, representa mais um avanço no esforço da Receita Federal em padronizar o tratamento contábil e fiscal dos créditos tributários reconhecidos judicialmente. O documento, que vincula-se às Soluções de Consulta COSIT nº 183/2021, nº 308/2023, nº 257/2024 e nº 267/2024, reflete a tentativa da administração tributária de estabilizar o regime de reconhecimento de receitas decorrentes de decisões transitadas em julgado e sua consequente repercussão sobre o IRPJ, CSLL, PIS e COFINS.

O eixo central do entendimento repousa sobre o momento de reconhecimento da receita para fins de tributação pelo IRPJ e CSLL, quando a pessoa jurídica obtém crédito decorrente de decisão judicial definitiva que reconhece indébito tributário. Conforme o ato, a receita deve ser oferecida à tributação no mês da entrega da primeira Declaração de Compensação, na qual se declara, sob condição resolutória, o valor integral a ser compensado. A lógica subjacente é que, enquanto o crédito não é formalmente declarado, o direito à restituição permanece em estado potencial, sendo apenas com a DComp que a obrigação tributária se aperfeiçoa.

Esse raciocínio aplica-se inclusive às compensações oriundas de mandados de segurança, quando não há definição expressa de valores pelo juízo. A norma ainda esclarece que, se a empresa tiver registrado contabilmente os valores antes da entrega da DComp, a tributação se desloca para o momento da escrituração contábil, conforme os princípios da competência e da prevalência da substância sobre a forma.

No campo prático, a Solução de Consulta nº 4055/2025 reforça a necessidade de alinhamento entre contabilidade, jurídico e fiscal, uma vez que o reconhecimento do indébito — ainda que condicionado à compensação — impacta diretamente o resultado do período e, consequentemente, a base de cálculo do IRPJ e da CSLL. O tratamento é uniforme tanto para empresas que apuram com base na receita bruta quanto para aquelas que adotam balanço ou balancete de suspensão ou redução, afastando divergências interpretativas que historicamente permeavam a aplicação desses regimes.

Outro ponto relevante da consulta é a reafirmação da tese do Tema 962 do STF (RE 1.063.187/SC), segundo a qual os juros de mora pela taxa Selic recebidos em ações de repetição de indébito não integram a base de cálculo do IRPJ e da CSLL. A Receita explicita que essa exclusão também alcança créditos reconhecidos em mandados de segurança e pedidos administrativos de restituição, desde que observados os marcos temporais da modulação fixada pelo Supremo e reproduzidos no Parecer SEI nº 11.469/2022/ME.

Quanto ao PIS e à COFINS, a orientação segue a linha já consolidada: não há incidência sobre o valor principal do indébito, mas os juros de mora são considerados receita tributável a partir do momento em que o indébito principal é reconhecido. O regime de competência passa, assim, a reger o reconhecimento mensal desses acréscimos, garantindo simetria entre o fato econômico e sua repercussão fiscal. Quando a compensação é declarada via DComp, os juros acumulados até essa data devem integrar a base de cálculo das contribuições no mesmo período.

Esse conjunto de disposições revela uma postura mais consistente da Receita Federal, que busca integrar jurisprudência, princípios contábeis e regras de competência fiscal em um único eixo interpretativo. Ainda que o entendimento mantenha a rigidez característica da tributação de receitas por decisão judicial, há uma tentativa clara de equilibrar segurança jurídica e previsibilidade operacional, especialmente diante da crescente utilização de créditos reconhecidos judicialmente como instrumentos de compensação de passivos tributários.

Do ponto de vista estratégico, a Solução de Consulta nº 4055/2025 sinaliza a necessidade de as empresas revisarem suas práticas de contabilização de créditos judiciais, com especial atenção à sincronia entre o reconhecimento contábil, a entrega da DComp e a tributação reflexa. A ausência de coordenação entre essas etapas pode gerar autuações, distorções no resultado fiscal e questionamentos sobre a observância do princípio da competência.

O cenário delineado pela Receita Federal exige, portanto, gestão técnica e jurídica integrada: o crédito reconhecido judicialmente não é apenas um ativo a recuperar, mas um fato contábil que produz efeitos tributários imediatos e exige aderência aos marcos legais e jurisprudenciais vigentes.


Chambarelli Advogados – Arquitetura Jurídica para Negócios em Transformação
Escritório especializado em Direito Tributário e Empresarial, com atuação estratégica na gestão de créditos tributários, compensações e reestruturação fiscal de empresas.

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