
No mercado imobiliário, é comum a cessão de direitos aquisitivos sobre imóveis em fase de regularização, com pagamento parcelado e previsão de lavratura da escritura definitiva após quitação e saneamento registral. Quando o adquirente desiste do negócio, muitas vezes surge a falsa impressão de que os valores recebidos e posteriormente devolvidos deixam de produzir efeitos tributários — o que não corresponde à interpretação da Receita Federal.
A questão central diz respeito à tributação dos valores recebidos pelo cedente (vendedor) em contratos de cessão de direitos sobre imóveis quando, mesmo após a celebração e início dos pagamentos, há posterior rescisão. Ainda que os imóveis não tenham sido formalmente transferidos e o negócio tenha sido desfeito, o entendimento fiscal dominante é de que a operação gerou fato gerador do Imposto de Renda, com a incidência do ganho de capital no momento do recebimento de cada parcela.
O cerne da interpretação repousa nos artigos 114, 116 e 117 do Código Tributário Nacional, e no art. 3º da Lei nº 7.713/1988, que equiparam a cessão de direitos à alienação de bens. Conforme reforçado pela Instrução Normativa SRF nº 84/2001, o ganho de capital, em vendas a prazo, deve ser apurado como se à vista fosse, com tributação proporcional ao recebimento.
Em outras palavras: o simples recebimento parcial do valor pactuado, mesmo que precedido de desistência posterior do negócio, já configura acréscimo patrimonial tributável. A devolução posterior dos valores, ainda que com abatimento de multa contratual, não afasta a exigência fiscal sobre o ganho inicialmente apropriado.
Essa posição foi ratificada na Solução de Consulta COSIT nº 214/2024, que reafirma a materialidade do fato gerador com a assinatura do contrato, independentemente da futura rescisão. A Receita considera irrelevante a cláusula resolutória contratual — para fins tributários, o negócio se reputa perfeito e acabado no momento da cessão.
Além disso, a multa rescisória recebida por pessoa física do adquirente pessoa jurídica, ainda que intitulada “indenizatória”, está sujeita à incidência do IRRF à alíquota de 15%, nos termos do art. 70 da Lei nº 9.430/1996 e art. 740 do RIR/2018. A responsabilidade pela retenção e recolhimento recai sobre a empresa pagadora, e os valores devem ser informados na Declaração de Ajuste Anual, sem sujeição ao carnê-leão.
Em síntese:
A rescisão não anula o fato gerador do IR: se houve cessão de direitos e recebimento de valores, há tributação sobre o ganho de capital;
A devolução posterior não exime o cedente do tributo já devido;
A multa contratual recebida é tributável na fonte quando paga por pessoa jurídica;
O contribuinte deve ficar atento ao correto lançamento dos valores na declaração anual.
É mais uma demonstração de que, no campo fiscal, a substância do negócio — e não sua conclusão formal — é o que importa. Cessão de direitos com recebimento de valores configura, para fins tributários, alienação consumada.
16/11/2022
Guilherme Chambarelli
29/06/2025
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