Foto Isenção de IRPF na venda de imóvel e multipropriedade: Solução de Consulta COSIT nº 236/2025
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Isenção de IRPF na venda de imóvel e multipropriedade: Solução de Consulta COSIT nº 236/2025

24/11/2025

Guilherme Chambarelli

A Receita Federal publicou, em 17 de novembro de 2025, a Solução de Consulta COSIT nº 236/2025, consolidando uma interpretação decisiva para pessoas físicas que vendem imóvel residencial e utilizam o produto da venda para quitar cotas de multipropriedade. O entendimento afasta, de forma expressa, a aplicação da isenção do art. 39 da Lei nº 11.196/2005 (Lei do Bem) nesses casos, reforçando uma leitura estrita da norma isentiva e redefinindo a fronteira entre “imóvel residencial” e “direito de uso periódico”.

Com impacto direto em transações cada vez mais frequentes — sobretudo em destinos turísticos com forte exploração de fractional ownership — a Receita delimita o que efetivamente constitui “aquisição de imóvel residencial” para fins de isenção de ganho de capital.


A lógica da isenção do art. 39 da Lei nº 11.196/2005

O benefício fiscal já é conhecido:
A pessoa física que vende um imóvel residencial e aplica o produto da venda, em até 180 dias, na aquisição de outro imóvel residencial, pode usufruir da isenção do IRPF sobre o ganho de capital.

Desde 2022, com o Parecer SEI nº 15069/2022/ME, essa abrangência foi ampliada, permitindo que a isenção também cubra:

  • quitação de financiamento de imóvel já possuído;

  • aquisição de imóvel em construção ou na planta;

  • amortização de débito remanescente junto ao alienante.

A razão teleológica adotada pelo STJ — e incorporada pelo Parecer — é clara: viabilizar a mobilidade familiar, permitindo que o contribuinte compre o segundo imóvel antes de vender o primeiro, preservando a finalidade habitacional da norma.


A pergunta que gerou a Solução de Consulta nº 236/2025

O caso concreto é típico dos novos produtos imobiliários:
O contribuinte vendeu seu imóvel e desejava utilizar os recursos para quitar financiamento de cota de multipropriedade — modalidade prevista nos arts. 1.358-B a 1.358-F do Código Civil, pela qual o adquirente compra frações de tempo de uso de um imóvel, e não a integralidade da unidade.

A dúvida:
Pode a isenção ser aplicada quando o destino dos recursos é a quitação de cota de multipropriedade?


A resposta da Receita Federal: NÃO

A COSIT 236/2025 foi taxativa.

Cota de multipropriedade NÃO é imóvel residencial para fins de aplicação da isenção do art. 39 da Lei do Bem.

A conclusão se sustenta em três pilares jurídicos centrais:


1. A leitura literal das normas isentivas (art. 111, II, do CTN)

A Receita reforça que qualquer benefício fiscal deve ser interpretado literalmente.
O art. 39 fala em “aquisição de imóveis residenciais”, não de direitos de uso rotativo.

A multipropriedade concede ao titular uso temporário, e não posse plena do imóvel.


2. Multipropriedade ≠ aquisição de imóvel

Nos termos do art. 1.358-C do Código Civil:

  • o imóvel é indivisível;

  • o multiproprietário compra uma fração de tempo;

  • há direito de uso, não aquisição da unidade.

Logo, a Receita entendeu que a multipropriedade é mais próxima de um direito real limitado do que de uma aquisição imobiliária tradicional.


3. A finalidade habitacional da norma isentiva não é atendida

A COSIT retoma a ratio decidendi do STJ:
A isenção existe para permitir que famílias adquiram nova moradia enquanto residem na atual.

Mas a multipropriedade, por natureza:

  • destina-se ao uso esporádico;

  • serve a lazer, não a moradia habitual;

  • não atende à função social que fundamenta a isenção.

Portanto, o benefício não se estende às frações de uso.


E se o financiamento da multipropriedade tiver sido feito diretamente com o vendedor?

A Receita também respondeu a esse ponto:
É irrelevante.
Mesmo se o financiamento for direto com o alienante, isso não altera o enquadramento jurídico da multipropriedade — e, portanto, não habilita a isenção.


Impactos práticos: onde o contribuinte erra?

A Solução de Consulta fecha a porta para uma tese que muitos contribuintes vinham adotando:
Aplicar a isenção do art. 39 para quitar cotas de multipropriedade por analogia, sob o argumento de que se trata de “imóvel residencial”.

Com a posição da COSIT:

  • qualquer ganho de capital decorrente da venda do imóvel residencial deve ser tributado;

  • a alíquota progressiva de 15% a 22,5% se aplica normalmente;

  • operações estruturadas para aquisição de multipropriedade deixam de ser elegíveis ao benefício.

Empreendimentos imobiliários turísticos que utilizam estrutura de multipropriedade também passam a demandar maior atenção contratual e tributária, pois ofertas comerciais podem induzir contribuintes a erro ao sugerir “benefícios fiscais inexistentes”.


Conclusão: o limite está traçado

A Receita Federal definiu com precisão:

Cota de multipropriedade não é imóvel residencial.
Logo, não gera isenção do IRPF sobre ganho de capital na venda do imóvel anterior.

A Solução de Consulta COSIT nº 236/2025 encerra o debate no âmbito administrativo, impondo aos contribuintes e ao mercado imobiliário a necessidade de readequar estratégias, especialmente em operações envolvendo frações de uso turístico.

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