
A recente postura da Receita Federal ao interpretar a alienação definitiva de participações societárias como se fosse uma cessão de direitos sujeita ao percentual de presunção de 32% no lucro presumido tem gerado perplexidade e forte insegurança jurídica.
O entendimento, expresso em soluções de consulta recentes, amplia indevidamente o alcance da alínea “c” do §1º do artigo 15 da Lei nº 9.249/1995, originalmente voltada às hipóteses de cessão temporária e onerosa de direitos, típicas de contratos de natureza continuada ou de exploração econômica de serviços.
A alienação definitiva de quotas ou ações não é cessão. Trata-se de compra e venda de bem incorpóreo, equiparável à venda de mercadorias ou de ativos corpóreos. Por isso, deveria seguir a regra geral do regime do lucro presumido, com percentuais de 8% para o IRPJ e 12% para a CSLL.
Ao equiparar venda e cessão, a Receita distorce a sistemática:
amplia a incidência da presunção majorada, que deveria ser restrita;
trata operações de alienação de ativos de forma mais onerosa do que a venda de mercadorias;
compromete a coerência do regime simplificado do lucro presumido.
O resultado é uma majoração indireta de carga tributária sem respaldo legal, contrariando o princípio da estrita legalidade e a vedação constitucional de alterar conceitos de direito privado para fins tributários.
Se essa interpretação prosperar, qualquer venda de bem incorpóreo — quotas, marcas, patentes, softwares — poderá ser enquadrada no percentual de 32%. Isso praticamente esvaziaria a regra geral, tornando a exceção mais ampla que o próprio regime-base.
Não por acaso, há decisões do Carf reconhecendo que apenas a cessão temporária se sujeita à presunção majorada, afastando sua aplicação em casos de alienação definitiva.
O caso revela um problema recorrente: a tentativa da administração tributária de estender exceções para além dos limites legais, em prejuízo da segurança jurídica e da previsibilidade que deveriam nortear o regime do lucro presumido.
A venda de participações societárias é compra e venda. Tratar essa operação como cessão é criar, por interpretação administrativa, um novo fato gerador não previsto em lei. Para os contribuintes, o tema exige acompanhamento atento e, quando necessário, contestação administrativa ou judicial, a fim de preservar direitos e evitar aumentos indevidos de carga tributária.
No Chambarelli Advogados, assessoramos empresas e grupos familiares em operações societárias, estruturação tributária e defesa administrativa e judicial, sempre com foco em redução de riscos e fortalecimento da segurança jurídica.
06/03/2024
Guilherme Chambarelli
27/06/2025
Guilherme Chambarelli
05/09/2025
Guilherme Chambarelli