
A utilização de holdings patrimoniais e familiares como instrumento de organização societária e sucessória se consolidou no Brasil. Contudo, à medida que essas estruturas se popularizam, os fiscos estaduais têm direcionado atenção crescente para a forma como os lucros são distribuídos entre os sócios. O ponto central da controvérsia: a incidência do ITCMD quando há distribuição desproporcional de lucros.
O artigo 1.007 do Código Civil autoriza expressamente que a distribuição de lucros não siga, necessariamente, a proporção das quotas ou ações detidas por cada sócio. Para que essa prática seja válida, basta que esteja prevista no contrato social ou em deliberação societária regularmente aprovada.
Na prática, essa flexibilidade abre espaço para que sócios majoritários renunciem a parte de seus lucros em favor de outros sócios, como filhos ou familiares, sem alteração da participação societária formal. É nesse ponto que surge o debate tributário.
Tribunais estaduais, em especial o TJ-SP, têm decidido que a distribuição desproporcional de lucros pode configurar doação disfarçada, sujeita à incidência de ITCMD, quando não há justificativa negocial que a sustente.
Em julgados recentes, os desembargadores reforçaram que a simples transferência de lucros dos sócios controladores para herdeiros, sem atuação efetiva destes na gestão ou sem contraprestação clara, revela o animus donandi. Ou seja, a prática, ainda que autorizada pelo Código Civil e prevista no contrato social, é tratada como liberalidade tributável.
Por outro lado, quando a desproporcionalidade encontra fundamento em razões empresariais objetivas — como recompensa por desempenho, responsabilidade assumida em projetos específicos ou necessidade de reter e motivar executivos estratégicos —, é possível afastar a caracterização como doação.
O problema é duplo. Se a distribuição desproporcional for entendida como mera doação, incide ITCMD. Mas se a justificativa estiver vinculada ao trabalho ou às funções exercidas pelo sócio, o pagamento pode ser requalificado como remuneração pelo labor, atraindo a incidência de IRPF e contribuições previdenciárias.
Esse cenário exige cautela redobrada. O que se busca evitar em uma frente — a tributação estadual — pode acabar se materializando em outra — a tributação federal.
Previsão clara no contrato social e nos acordos de sócios: a cláusula deve descrever não apenas a possibilidade de distribuição desproporcional, mas também os critérios objetivos que a justificam.
Documentação de propósito negocial: assembleias e atas devem registrar as razões concretas da decisão, evidenciando vínculo com a realidade empresarial.
Equilíbrio entre sucessão e gestão: se o objetivo for favorecer herdeiros, pode ser mais seguro estruturar a transmissão por meio de quotas ou usufruto, evitando que a distribuição de lucros seja interpretada como liberalidade.
Análise prévia de impactos fiscais: tanto na esfera estadual (ITCMD) quanto federal (IRPF), cada arranjo deve ser testado para medir o risco de autuação.
A distribuição desproporcional de lucros é legítima no ordenamento jurídico brasileiro, mas não é imune ao crivo fiscal. A tendência jurisprudencial tem sido a de enquadrar como doação tributável quando não há lastro em razões negociais consistentes.
No limite, a ausência de cautela pode transformar um instrumento de gestão societária em um passivo tributário inesperado. Por isso, o caminho seguro é alinhar os atos societários à realidade da empresa, registrar adequadamente as deliberações e antecipar a análise tributária.
No Chambarelli Advogados, assessoramos famílias empresárias e holdings patrimoniais na estruturação de modelos societários e sucessórios que conciliam eficiência tributária, segurança jurídica e governança de longo prazo.
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Guilherme Chambarelli
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