
Com a Emenda Constitucional nº 132/2023 e a posterior Lei Complementar nº 214/2025, o Brasil inaugurou o sistema do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), unificando tributos como PIS, Cofins, ISS e ICMS.
No mercado imobiliário, as mudanças foram expressivas. Além da incidência sobre a compra e venda de imóveis, o legislador incluiu determinadas hipóteses de locação, entre elas a locação por temporada, tradicionalmente tratada pelo Direito Civil como cessão de uso de bem imóvel.
Essa equiparação levanta controvérsias jurídicas relevantes: pode um contrato de locação, que tem natureza de obrigação de dar, ser tributado como se fosse prestação de serviço?
A LC 214/2025 estabelece regimes distintos para pessoas jurídicas e pessoas físicas:
Pessoas jurídicas que exploram locação ou venda de imóveis devem recolher IBS e CBS sobre o valor da operação, excluídas despesas como IPTU, condomínio e emolumentos.
Pessoas físicas passam a ser consideradas contribuintes regulares quando:
no ano anterior, tiverem receita de locação superior a R$ 240 mil ou mais de três imóveis locados;
ou no ano corrente, alcançarem R$ 288 mil em receitas de aluguel, ainda que provenientes de apenas um imóvel.
A lei ainda prevê a figura do “fornecedor habitual” (art. 21), permitindo que a Receita enquadre locadores como contribuintes mesmo sem atingirem os limites de receita ou quantidade de imóveis, caso caracterizada atividade econômica reiterada.
Embora a alíquota combinada de IBS/CBS deva girar em torno de 28%, a LC 214 traz reduções específicas:
50% na compra e venda de imóveis (alíquota efetiva de ~14%);
70% na locação, cessão onerosa ou arrendamento (alíquota efetiva de ~8,4%).
Ainda assim, para muitos pequenos locadores, especialmente pessoas físicas que utilizam a renda do aluguel como complemento, essa tributação representa novidade onerosa.
A Lei do Inquilinato (Lei nº 8.245/1991) caracteriza a locação por temporada como contrato residencial, destinado a moradia transitória por prazo de até 90 dias. Sua natureza jurídica é de cessão de uso — obrigação de dar, não de fazer.
Já a LC 214/2025 (art. 253) equiparou a locação por temporada a serviços de hospedagem, atribuindo-lhe regime tributário de atividade econômica. Essa equiparação contrasta com a tradição civilista e com precedentes constitucionais que delimitam a noção de “serviço” como obrigação de fazer.
O Supremo Tribunal Federal, na ADI 3.149 e na Súmula Vinculante nº 31, firmou entendimento de que locação não constitui prestação de serviço e, portanto, não se sujeita a ISS. O mesmo raciocínio deveria ser aplicado ao IBS e à CBS.
A previsão da LC 214 abre espaço para questionamentos constitucionais sob três fundamentos principais:
Competência tributária (art. 156, III, CF): ampliar o conceito de serviço para abranger locação de imóveis ultrapassa os limites da Constituição.
Princípio da legalidade estrita (art. 150, I, CF): criar hipótese de incidência fora da moldura constitucional compromete a validade da norma.
Segurança jurídica e capacidade contributiva: onerar locadores residenciais de forma desproporcional, sem correlação com sua real capacidade econômica, viola princípios constitucionais.
A tributação da locação por temporada gera reflexos imediatos:
Pessoas físicas podem passar a arcar com carga tributária inédita, impactando a rentabilidade de pequenos investidores;
Pessoas jurídicas devem rever estruturas contratuais e societárias, especialmente em negócios intermediados por plataformas digitais;
Contencioso constitucional: a contradição entre a tradição civilista e a LC 214/2025 tende a ser levada ao STF para definição de compatibilidade com a Constituição.
A criação do IBS e da CBS representa avanço na simplificação do sistema, mas a extensão de sua incidência à locação por temporada evidencia um choque conceitual. De um lado, a Constituição e a legislação civil qualificam a locação como cessão de uso; de outro, a lei complementar a trata como serviço, sujeitando-a à tributação do IVA dual.
Esse descompasso projeta um cenário de insegurança jurídica e antecipa intensos debates judiciais. Até que o tema seja pacificado, locadores e investidores precisam reavaliar estratégias de estruturação e considerar os riscos tributários associados à locação temporária.
Chambarelli Advogados atua de forma estratégica em Direito Tributário e Societário, assessorando empresas, holdings patrimoniais e investidores na interpretação do novo sistema do IBS/CBS e na adoção de estruturas seguras para o mercado imobiliário. Nosso compromisso é proteger o patrimônio, garantir segurança jurídica e antecipar riscos diante das mudanças legislativas.
01/09/2025
Guilherme Chambarelli
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