
O CARF tem reiterado que a distribuição desproporcional de lucros nas sociedades limitadas exige previsão contratual, documentação e escrituração consistente. Entenda os precedentes e os cuidados necessários para evitar requalificação como pró-labore.
A distribuição desproporcional de lucros é instituto admitido pelo Código Civil (arts. 1.007 e 1.008), permitindo que sócios de sociedades limitadas deliberem percentuais diferentes da proporção de suas quotas. A prerrogativa, em tese, confere flexibilidade societária e adequação à realidade econômica do negócio.
Contudo, recentes julgados do CARF – Conselho Administrativo de Recursos Fiscais têm reforçado que, se essa prática não for acompanhada de formalização e prova documental robusta, o fisco tende a requalificar os valores como remuneração por serviços, com exigência de IRPF, contribuições previdenciárias e multas.
No acórdão nº 2101-003.144, julgado em 06/06/2025, o CARF analisou caso em que valores registrados como “lucros e dividendos isentos” foram requalificados como remuneração por serviços médicos.
Apesar da existência de previsão legal genérica no Código Civil, foram constatadas diversas fragilidades que enfraqueceram a defesa dos contribuintes:
inexistência de previsão contratual em parte do período autuado;
pagamentos feitos antes mesmo de o beneficiário assumir a condição de sócio;
desproporção acentuada frente à participação societária mínima;
vinculação direta dos pagamentos à produtividade individual;
repasses realizados inclusive a pessoas não sócias, físicas e jurídicas;
ausência de deliberação formal dos sócios;
escrituração contábil irregular.
Esse conjunto de inconsistências levou a turma julgadora a concluir que não havia distribuição legítima de lucros, mas sim dissimulação de pró-labore.
O julgamento dialoga com outros acórdãos recentes:
Acórdão nº 2202-011.272 (09/05/2025) – manteve a autuação pela ausência de previsão contratual, demonstrando que a cláusula é requisito mínimo.
Acórdão nº 2201-012.005 (04/02/2025) – cancelou a autuação porque havia prova robusta da regularidade do procedimento, evidenciando que documentação consistente pode afastar a tese da fiscalização.
Acórdão nº 1101-001.489 (12/12/2024) – já havia sinalizado que a mera previsão contratual não é suficiente sem a comprovação documental e a coerência entre forma e realidade operacional.
A convergência desses julgados mostra que o CARF busca uniformizar o entendimento: flexibilidade contratual não elimina o dever de formalização e prova documental.
A partir dessa linha jurisprudencial, três conclusões se impõem para sociedades que pretendem adotar a distribuição desproporcional de lucros como estratégia societária e fiscal:
Previsão contratual expressa – a cláusula no contrato social é requisito indispensável e deve estar vigente durante todo o período em que os pagamentos ocorrerem.
Documentação e deliberação formal – atas, assembleias ou reuniões de sócios precisam registrar de forma clara os critérios da desproporção e a decisão coletiva.
Escrituração e coerência operacional – os lançamentos contábeis devem ser regulares e alinhados à realidade econômica da sociedade. Qualquer vínculo direto com produtividade individual fragiliza a tese de distribuição de lucros.
A distribuição desproporcional de lucros é instituto legítimo, mas que exige cuidados formais para evitar autuações. A jurisprudência do CARF demonstra que a ausência de robustez documental transforma a prática em um ponto sensível de risco fiscal.
Assim, mais do que incluir uma cláusula contratual, é essencial estruturar todo o processo decisório e contábil com consistência e transparência. A forma, aqui, não é mero detalhe: trata-se de elemento central de validade fiscal.
No Chambarelli Advogados, acompanhamos de perto a evolução desses precedentes e assessoramos empresas na construção de estruturas societárias seguras, governança sólida e práticas de distribuição de resultados que conciliem eficiência fiscal e conformidade regulatória.
15/07/2025
Guilherme Chambarelli
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Guilherme Chambarelli
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Guilherme Chambarelli
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26/06/2025
Guilherme Chambarelli
29/06/2025
Guilherme Chambarelli