
Um contrato bem redigido é um convite à confiança. Um mal redigido, um bilhete para o litígio. No universo empresarial, em que parcerias, fornecedores e clientes se relacionam por escrito, o contrato deixa de ser mera formalidade: ele é o guarda-chuva jurídico sob o qual todas as promessas de negócio tentam se proteger.
Mas o que poucos empreendedores sabem — especialmente em startups ou pequenas empresas — é que não basta “ter um contrato assinado”. Um contrato pode conter cláusulas que parecem boas, mas que, na prática, não produzem efeito. Ou pior: cláusulas que são nulas, por violarem a lei ou a boa-fé contratual. E o risco é claro — confiar em uma cláusula ineficaz é como andar com colete à prova de balas que não resiste a uma pedra.
O primeiro erro comum é tentar renunciar a direitos indisponíveis. Um contrato de prestação de serviços, por exemplo, não pode afastar de forma absoluta a responsabilidade por vícios ocultos. Tampouco pode impedir um consumidor de buscar o Judiciário em caso de descumprimento. A legislação brasileira impõe limites à autonomia privada, e qualquer cláusula que contrarie normas de ordem pública será considerada nula, ainda que as partes tenham concordado expressamente.
Outro ponto crítico são cláusulas genéricas de penalidades. O contrato diz que, em caso de descumprimento, haverá “multa de 20%”, mas não define qual obrigação foi violada, se a multa é compensatória ou moratória, nem qual será o prazo para correção. Esse tipo de cláusula — escrita no calor da negociação, sem técnica — frequentemente é afastada judicialmente por falta de clareza ou desproporcionalidade.
A mesma fragilidade aparece nas chamadas cláusulas de eleição de foro. Muitos empresários colocam fóruns aleatórios nos contratos (como “Barueri/SP” ou “Curitiba/PR”) para “baratear custos” ou “dificultar o processo”, mas ignoram que a Justiça pode declarar o foro abusivo se houver desequilíbrio entre as partes. Se o contratante for hipossuficiente ou se a sede da empresa for distante do local eleito, essa cláusula pode ser invalidada.
Há também os riscos escondidos nas cláusulas de confidencialidade, não concorrência e exclusividade. Elas devem conter limitações temporais, territoriais e de escopo, sob pena de serem consideradas excessivas. Não adianta proibir o ex-colaborador de “atuar em qualquer empresa concorrente no Brasil por 5 anos” — a Justiça tende a proteger a liberdade profissional e limitar essas proibições com base no princípio da razoabilidade.
Outro cuidado essencial é com cláusulas que dependem de condições futuras, como pagamentos variáveis, bônus de performance ou conversão de investimentos. Se essas condições forem descritas de maneira ambígua, sem critérios objetivos de apuração, o contrato perde sua eficácia. A cláusula se torna inexequível, e abre espaço para disputas interpretativas que travam o negócio.
E não menos importante: os contratos empresariais precisam falar a linguagem do negócio. Muitos modelos prontos circulam na internet com cláusulas desatualizadas, redação truncada ou estrutura incompatível com a operação real da empresa. Copiar contratos sem orientação jurídica é como usar um GPS estrangeiro em estrada brasileira — parece ajudar, mas pode te levar direto para o abismo.
Por isso, a recomendação é simples, mas poderosa: dedique atenção ao contrato antes que ele seja necessário. Um bom contrato não é apenas aquele que prevê tudo — mas sim aquele que evita o conflito pela clareza, pela coerência e pela aderência à realidade das partes. Quando bem feito, ele não trava a operação — ele libera.
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Guilherme Chambarelli
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