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O que é SAFE (Simple Agreement for Future Equity)

10/07/2025

Guilherme Chambarelli

A ideia por trás do SAFE é tentadora. Um contrato simples, direto, sem juros, sem prazo de vencimento, e que permite captar investimento rapidamente, sem ter que discutir valuation ou fazer alterações societárias imediatas. Na prática, o SAFE — sigla para Simple Agreement for Future Equity — tornou-se o queridinho do Vale do Silício. E naturalmente, chegou ao Brasil, como toda tendência que mistura inovação, capital e uma promessa de simplicidade.

Mas nem tudo que é simples é seguro. E nem tudo que vem do exterior se encaixa na realidade jurídica brasileira.

O SAFE foi criado pela Y Combinator em 2013 como uma alternativa mais enxuta ao contrato de mútuo conversível. Em vez de tratar o investimento como um empréstimo (que pode se tornar participação societária no futuro), o SAFE assume desde o início que haverá conversão — mas adia o momento e as condições exatas para quando houver uma rodada de investimento qualificada. A lógica é a seguinte: “investimos agora, e quando vocês levantarem uma rodada maior, recebemos nossa parte”.

No Brasil, muitos fundadores e investidores vêm adotando o SAFE como modelo contratual, especialmente em estágios iniciais. Mas é aqui que mora o problema: o ordenamento jurídico brasileiro não reconhece, de forma expressa, esse tipo de instrumento. Ele não é um contrato típico. E sua falta de estruturação jurídica clara pode gerar conflitos no futuro — especialmente com órgãos de registro, Receita Federal, ou em uma due diligence mais rigorosa.

O SAFE, por exemplo, não tem valor de face como um mútuo. Ele não é um empréstimo, então não pode ser tratado como passivo exigível. Mas também não é capital, porque não houve integralização. Isso cria uma zona cinzenta contábil e tributária. Como classificar esse recurso no balanço? Como justificar sua entrada no caixa? Como calcular sua conversão futura? Essas são perguntas que o modelo americano não responde — e o modelo brasileiro ainda não resolveu.

Além disso, o SAFE não oferece garantias nem para o investidor, nem para a empresa. Em alguns modelos, se a rodada de conversão não acontece, o investidor pode nunca se tornar sócio. Se a empresa for vendida antes da conversão, as regras podem ser interpretadas de forma distinta. Em outras palavras, um SAFE mal redigido pode ser o gatilho de litígios societários e fiscais — especialmente quando entra em cena o investidor que não leu as letras miúdas.

Outro risco recorrente é a diluição inesperada dos fundadores. Como o SAFE adia a discussão do valuation, os empreendedores muitas vezes não percebem o real impacto de múltiplos SAFEs emitidos ao longo do tempo. Quando chega a rodada de conversão, o cap table explode — e a surpresa é amarga. O sonho de manter 70% da empresa se transforma em um controle minoritário sem aviso prévio.

Então, por que usar o SAFE? Ele pode ser útil quando bem estruturado, com apoio jurídico, em rodadas muito iniciais, para valores pequenos e com investidores bem alinhados. Ele não substitui o mútuo conversível — que, embora mais formal, já está consolidado em nossa prática jurídica. E não deve ser usado sem customização: cada SAFE precisa ter cláusulas de proteção, mecanismos de conversão bem definidos, previsões para liquidez antecipada e, principalmente, respaldo documental sobre sua natureza.

Portanto, fundadores de primeira viagem, atenção: o SAFE pode parecer simples no nome, mas exige sofisticação na execução. Um contrato que adia decisões críticas não elimina o risco — apenas o transfere para o futuro. E no mundo das startups, o futuro costuma chegar mais rápido do que se espera.

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